Entrevista Flavia Mariotto
Especialista em Marketing, com 20 anos de expertise no mercado, Flavia Mariotto, CEO da FM Consultoria, aborda o avanço do marketing digital nas últimas décadas, diferenças de mercado nos países que sua empresa atua, implementação do marketing com responsabilidade social e ao meio ambiente, além de opinar sobre um cenário atual e pós-pandêmico.
“ Gosto muito de adaptar, reinventar e experimentar estratégias em diferentes segmentos e mercados”, Flavia Mariotto
Você tem duas décadas de expertise em Marketing. Como você se interessou por marketing digital?
Flavia Mariotto – Tenho que confessar que foi uma relação que começou de forma silenciosa, tímida e até despretensiosa nos primórdios do digital, lá em 2010. Nessa época trabalhava com e-mail marketing, perfil corporativo no Facebook, desenvolvimento de website… com foco para o posicionamento da marca e cuidado com a experiência do cliente e em parceria com especialistas de social media. Em 2013 foi um salto enorme no digital para mim, pois foi quando efetivamente mergulhei no mundo do social media e logo percebi que seria um caminho complexo e sem volta.
Até 2017 trabalhei em parcerias com especialistas do ambiente digital em diferentes aspectos – foram profissionais e agências muito bem posicionados, super experientes e com expertises incríveis que tive o privilégio de aprender muito, entre elas Patrícia Prates. Nos últimos anos o interesse pelo digital como consultora se consolidou e tornou-se a base do meu dia a dia profissional – todas as ações, estratégias e táticas são sempre pensadas para aplicação física e virtual, usando toda a bagagem que tive a honra de criar com os especialistas e me aliando com parceiros extremamente capacitados que fazem acontecer no SEO, ADs, search e etc.
Atualmente você atua em dois países – Brasil e Portugal – quais as diferenças de mercado que lhe chama atenção?
Flavia Mariotto – Mercado é feito por pessoas, pessoas são influenciadas e influenciam o mercado – então posso dizer que noto enormes diferenças e muitas semelhanças. Desde a jornada do cliente, passando pela escolha das plataformas digitais e as dimensões culturais, é possível perceber e aprender com os dois mercados a ponto de obter uma troca muito rica – e eficiente – tanto em termos de estratégia quanto em processos.
Como esperado, a diferença no tamanho dos mercados é impactante, mas acredito que as diferenças culturais são as mais marcantes pois impactam imediatamente no comportamento, consumo e uso das plataformas digitais.
Algumas diferenças simples – no Brasil se usa whatsapp nas comunicações do dia a dia, em Portugal é o sms; Segundo o relatório de 2021 do We are Social, no Brasil 66% dos utilizadores ativos nas redes sociais usam o Facebook messenger, já em Portugal a rede possui mais de 79% de usuários – mais que Instagram!
Também noto uma velocidade no crescimento, investimento e amadurecimento do mercado digital muito grande em Portugal – para se ter ideia, em comparação a 2020, Portugal ampliou a quantidade de usuários nas redes sociais em 11,4% – globalmente a taxa de crescimento foi de 13,2%.
Tenho que confessar que as diferenças, a necessidade de adaptação e aprendizado contínuo é algo que me atrai muito – e trabalhar com diferentes mercados e culturas é ter esse desafio constantemente. Gosto muito de adaptar, reinventar e experimentar estratégias em diferentes segmentos e mercados, e entre esses dois países não é diferente.
Qual a importância da comunicação digital na ascensão de uma marca ou produto no mercado atual?
Flavia Mariotto – Decisiva. Qualquer marca bem sucedida precisa estar posicionada de forma estratégica, consistente, genuína e eficiente, e isso se obtém através de comunicação. Vivemos a era das relações, e a construção de uma relação benéfica mútua e sustentável começa, desenvolve e se estreita através da comunicação.
Notou que eu ainda nem mencionei a palavra digital? Ao meu ver a comunicação – verbal e não verbal – acontece onde as pessoas estão, então fica implícita a dimensão digital aqui.
O mundo mudou e hoje experimentamos novas formas de estar, trabalhar, consumir e comunicar. No ambiente digital os desafios da comunicação são ainda maiores – estamos falando de percepção, sensação, tom, persona, autenticidade, frequência, algoritmos… e tantos outros fatores que influenciam diretamente uma marca ou produto. Estudo, experimentação e clareza são ainda mais essenciais no ambiente virtual quando falamos de comunicação e branding.
O que é essencial para iniciar uma marca no mundo digital?
Flavia Mariotto – Uma das coisas mais simples e difíceis para qualquer marca: clareza. Saber “o que, como, quando, quanto, onde e para quem” não é mais suficiente para iniciar uma marca bem-sucedida, ainda mais no feroz ambiente digital.
Ter clareza do impacto da política e da tecnologia no seu negócio, o que influencia diretamente e indiretamente o seu segmento, conhecer os hábitos sociais, culturais e de consumo, aprender com seus concorrentes e substitutos, olhar as tendências e inovações são alguns dos aspectos essenciais para o início consistente de uma marca em qualquer ambiente, real ou virtual.
Agora você está pensando: “nossa, a Flavia é muito burocrática; isso é coisa para marca grande; não tenho tempo para isso, sei do meu negócio”. Compreendo esses pensamentos / sensações: Como empreendedora eu me identifico com a energia do “fazejamento” e partir para o lançamento, mas como gestora eu seria absolutamente irresponsável se eu não te dissesse que a falta de clareza custa – e muito! Mais que dinheiro, às vezes o custo é a sua credibilidade.
Essencial é entender muito bem como está seu segmento no ambiente digital, como ele consome, se comporta, quais as outras opções de marca e soluções substitutas etc. A clareza de onde está, para onde vai e como é bem mais complexa no ambiente digital, por isso a preparação através de dados e embasamento é fundamental.
Qual a maior dificuldade na execução de uma estratégia de marketing digital?
Flavia Mariotto – Hoje eu diria que são as mudanças praticamente constantes – hoje, por que amanhã pode ter algo mais impactante (risos nervosos). Se um dos maiores e mais valiosos objetivos de qualquer negócio é consistência, a resiliência pode até parecer antagônica em um olhar rápido, mas na verdade o desafio é se manter consistente de forma dinâmica e flexível.
Como se destacar dentro do bombardeio midiático das redes sociais? Como ser atrativo dentro do seu nicho?
Flavia Mariotto – Com propósito. E seu propósito não é vender, é agregar algum valor, sensação, experiência positiva na vida de outras pessoas. Com um propósito claro, minha melhor sugestão é o conteúdo de qualidade. Qualidade aqui não é uma produção super elaborada, com efeitos do Spielberg – é genuíno, autêntico, relevante, no momento certo e com o tom adequado, transmitido com forma e frequência adequada ao seu público. Não se engane, ter e exercitar o propósito em qualquer nicho requer muito, muito trabalho – por isso a clareza é tão importante.
Você acha que a pandemia acelerou o processo de transformação digital das empresas?
Sem dúvida. Diria ainda que acelerou e consolidou a transformação que já estava acontecendo em dimensão global. Pensando especialmente nos micro e pequenos negócios, empresas que ainda consideravam a digitalização dos processos e rotinas tiveram que se reinventar praticamente da noite para o dia. Aqueles setores mais tradicionais, os negócios familiares e de nicho por exemplo, entenderam da pior forma que o mercado hoje é global e digital. Dados do relatório We Social de 2021 mostram um crescimento de 7.6% no número de utilizadores de internet globalmente em relação a 2020 – somos 4.6 bilhões de pessoas online.
Mesmo os setores que já tinham um DNA digital mais forte precisaram se adaptar a um novo mundo digital, qual sua opinião sobre essas mudanças pós pandemia.
Flavia Mariotto – O investimento em tecnologia e inovação, dinâmicas online, processos digitais, home office e o visão estratégica se mostraram alternativas de emergência em meio à crise do coronavírus, mas que chegaram para ficar neste novo normal que está em construção. Os negócios terão cada vez mais o desafio de operarem com flexibilidade – para adoção de novas formas de trabalho, relacionamento, captação de clientes, comunicação, buscas contínuas por inovação e tantas outras frentes que posso mencionar.
Um outro aspecto fundamental que a pandemia veio ressaltar foi a importância da responsabilidade social dos negócios, do olhar para fora das marcas e de ter uma postura mais humanizada, empática, colaborativa e solidária. Se a digitalização é uma das tendências aceleradas pela pandemia, a outra grande transformação foi na mentalidade e no comportamento da própria sociedade – nesse novo normal, a humanização deve fazer parte das ações das marcas, seja na relação comercial, com os clientes, seja na relação organizacional com os colaboradores, parceiros, e demais stakeholders.
Entre os diferenciais da sua consultoria, está a prática de um conceito de Marketing Verde, com preocupação com o meio ambiente e responsabilidade social. Na sua opinião, qual a importância deste olhar no mercado atual?
Flavia Mariotto – Na realidade pós-pandemia e um ambiente digital em constantes mudanças, os negócios estão se reconectando com aquilo que têm de mais precioso: a sua humanidade. Questionamos cada vez mais a nossa forma de viver enquanto pessoas, profissionais e civilização. Realmente acredito que chegou o tempo de abraçar, com calma, ponderação e criatividade, os desafios imediatos que estamos vivendo através da nova normalidade.
Se por um lado, para os negócios é o momento de incorporar uma visão de marketing nas suas estratégias de negócio e de ter os recursos digitais para crescer neste mundo ultraconectado, por outro lado para marcas, consultorias, empresas e empreendedores, a oportunidade é provar que estão conscientes das suas obrigações em termos de bem-estar, cidadania e responsabilidade social e ambiental em prol de um mundo melhor.
Não estou falando de ações superficiais para parecer eco – estou falando de uma transformação profunda no processo de consumo, e as novas tendências de marketing como o bem-estar, a sustentabilidade, a economia circular, a inclusão, a linguagem inclusiva e o marketing social vieram para redefinir o que é ou não bem-sucedido.
O que um negócio que contrata uma consultoria de marketing digital precisa saber?
Flavia Mariotto – Não existe milagre, receita pronta, fórmula mágica e resultado garantido. Partindo do princípio que os negócios são feitos por pessoas e para pessoas, e que cada um de nós somos seres únicos, cada projeto de consultoria de marketing digital desenvolvido deverá ser igualmente único.
Acredito que, baseado nas melhores práticas de mercado, é essencial considerar a estrutura, recursos, valores e objetivos de cada marca para construir uma estratégia e executar uma operação de marketing bem-sucedida – e isso requer muito trabalho conjunto e paciência.
Uma consultoria de marketing só excede as expectativas das marcas se houver sinergia e sintonia com o cliente – trabalhar em conjunto, com confiança e persistência, para mim essa é uma das maiores e melhores chaves para o sucesso.